Encontros formais entre chefes de Estado e visitas presidenciais dificilmente produzem grandes resultados. Têm peso simbólico, mais que tudo. Na melhor das hipóteses, celebram a assinatura de acordos e o alinhamento de agendas. Contam com o trabalho mais ou menos intenso dos assessores para fazer com que os bastidores viabilizem resultados mais interessantes e promissores.

O que conseguiu Jair Bolsonaro em Washington? Chegou lá com as mãos vazias e pouca força política, ou seja, com quase nada a oferecer ao gigante do Norte além de apoios retóricos, declarações e mesuras protocolares. Esperava receber de Trump muito mais do que poderia entregar. Saiu de lá com a sensação de ter encontrado um parceiro para voos mais altos e com quem tem afinidade ideológica, mas pouco conseguiu extrair em termos de reciprocidade.

Faltou-lhe um programa de ação com envergadura mínima para produzir impacto no mundo e chamar atenção, um governo estruturado com explícita capacidade de gestão, uma equipe ministerial afinada e com clareza de propósitos. Organizou-se um encontro entre um presidente que precisa encontrar uma imagem para seu governo com outro presidente necessitado de apoios logísticos para manter vivos seus planos. Na mesa, mais que tudo, esteve a Venezuela, bola da vez da política externa norte-americana. Trump quer que o Brasil o auxilie a expulsar Maduro, se necessário recorrendo a algum tipo de intervenção armada. Bolsonaro não se definiu com clareza, tratando a “expulsão” de Maduro e a “libertação” dos venezuelanos como questões corriqueiras, fáceis de resolver. Fez coro a Trump ao deixar no ar a possibilidade de uma intervenção, alegando que “há questões que não podem ser divulgadas”. Para os presidentes, todas as opções deveriam ser postas na mesa, ainda que como ameaças.

Para o presidente brasileiro, cuja visita continha uma oportunidade para articular acordos comerciais e entendimentos econômicos, houve um interesse maior: mostrar ao mundo que há uma afinidade profunda entre Brasil e Estados Unidos no que vem sendo chamado de agenda “antiglobalista” que, no caso, significa tanto uma ação para esvaziar pautas estratégicas globais – o fortalecimento da ONU, a política migratória, os deslocamentos populacionais, os temas ambientais – quanto uma reiteração da ideologia regressista no plano dos costumes e de defesa dos valores ocidentais e cristãos, que tanto ruído provoca dentro do Brasil. Exibindo-se no exterior como candidato a expoente da extrema-direita nacional-populista internacional, Bolsonaro buscou manter mobilizada a turba que o segue dentro do País. Insistiu além da conta na tese de que finalmente há um presidente não “antiamericano” no Brasil, sem esclarecer qual a vantagem que tal fato pode ter para o Brasil.

Consta que os norte-americanos darão ao Brasil o status de aliado preferencial, com tratamento prioritário na área da Defesa. O privilégio poderá facilitar a transferência de tecnologia e impulsionar a indústria aeroespacial brasileira, além de ter desdobramentos no setor de armas e armamentos, algo que frequenta a retórica de Trump e Bolsonaro. O acordo para uso comercial da base de Alcântara caminha nessa direção, mas não pode ser contabilizado como uma vitória de Bolsonaro, já que estava desenhado anteriormente.

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Não é pouco, mas o alcance será limitado se o foco for o protagonismo do Brasil no mundo. Ficou solta a ideia de se obter o apoio dos EUA para ingresso brasileiro na Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), algo que repercutiria positivamente nas relações econômicas e comerciais do país, podendo mesmo servir para atrair investidores e empresas. Já há uma parceria do Brasil com a OCDE, mas o ingresso formal ajudaria o país a mostrar que está na trilha de um “crescimento com responsabilidade fiscal”. Não houve nenhum passo concreto nessa direção, com os norte-americanos mantendo-se desinteressados da questão. Em troca, Trump sinalizou com uma maior aproximação do Brasil com a OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte), promessa enigmática se se levar em conta que o Brasil está no Atlântico Sul e nenhum interesse terá de se envolver em conflitos armados de outras regiões.

Mas é bom não exagerar. O Brasil não é pouca coisa. É uma potência média, com um mercado interno precioso, uma população que tem seu valor, uma cultura que encanta. O País está num momento ruim, meio sem rumo, quase estagnado e gerando incertezas de todo tipo. Carece de estadistas e articuladores, lideranças com capacidade de sair dos embates ideológicos e unir democraticamente a sociedade, reconhecendo sua diversidade e sua desigualdade. Pode ser que arranque, mas a incógnita é enorme.

Para fazer jus ao seu peso no mundo, o Brasil precisa de uma política externa aberta, flexível, inteligente, que não ceda à subalternidade e saiba aproveitar as oportunidades que surgirem.

Em Washington, essa política externa não deu o ar da graça. O chanceler nem sequer apareceu nas fotos. Desse ponto de vista, a delegação brasileira voltou para casa com as mãos abanando. A troca de camisetas de futebol entre os dois presidentes, gentilezas à parte, com as devidas declarações oficiais, mostrou bem o teor das tratativas entre Trump e Bolsonaro.

As seguidas declarações de fidelidade incondicional a Trump, as juras de amor e admiração, o endosso às obsessões do presidente norte-americano, como a do muro com o México e a do confronto com a China, podem não ter ofuscado o que se obteve de positivo no plano econômico e comercial, que ainda terá de ser avaliado. Podem também produzir algum efeito em termos de ajuda norte-americana. Mas foram uma demonstração de subalternidade e fragilidade em termos de política externa, coisas inadequadas para um País que precisa reafirmar sua identidade internacional e se posicionar com vigor na estrutura do mundo.