No México, o ano de 2017 já começou com grande efervescência política. Tal conjuntura segue ampara por questões oriundas do contexto internacional, mas também pelo doméstico, colocando em forte questionamento a administração do presidente Enrique Peña Nieto.

No primeiro âmbito, a vitória de Donald Trump nas eleições dos Estados Unidos ainda repercute no vizinho, poucos dias antes do novo presidente tomar posse. Na sua primeira conferência de 2017, no dia 11 de janeiro, Trump voltou a mencionar os mexicanos, afirmando que não esperará as negociações com o governo do México para iniciar a construção de um muro na fronteira, já que o país pagará por ele na forma de reembolso ou por meio de impostos. Ademais, afirmou que o México se aproveitou dos Estados Unidos e que não vai mais permitir que isso ocorra, prometendo aumentar impostos das empresas norte-americanas que mudarem suas plantas para o país vizinho. Com isso, na sua visão, evita-se a perda de postos de trabalho nos Estados Unidos, “forçando” as empresas a produzirem no país.

As declarações do novo presidente norte-americano tiveram efeitos práticos imediatos. Na primeira semana do mês, a companhia estadunidense Ford anunciou que cancelará um investimento de 1,6 bilhões de dólares no México, os quais seriam usados para a construção de uma nova fábrica. Ainda durante a campanha eleitoral, Trump ameaçou taxar em 35% os carros que tivessem sido fabricados no México, o que afetaria tanto a Ford como a General Motors. Assim, ainda na conferência, Trump aproveitou também para agradecer à Ford e à Fiat Chrysler por investirem nos Estados Unidos.

Já no cenário doméstico, o presidente mexicano enfrenta fortes questionamentos acerca da sua primeira medida do ano, o aumento no preço da gasolina. Além dos protestos sociais, também foram registrados saques, mortes e relatos de mexicanos que cruzaram a fronteira com a Guatemala para abastecer seus carros. No dia 5 de janeiro, o presidente discursou defendendo a medida, justificando-a com base nos subsídios mantidos pelo ex-presidente Felipe Calderón e pelo aumento internacional do preço da gasolina. De acordo com Peña Nieto, o país já não tem condições econômicas de manter artificialmente o preço baixo, o que explicaria a necessidade dos aumentos.

Ainda de acordo com o presidente, o “gasolinazo” não está relacionado com a reforma energética, levada a cabo no seu primeiro ano de governo, em 2012. Esta reforma abriu o setor petroleiro no México, dando mais espaço para companhias privadas, em detrimento da empresa estatal, a Petróleos Mexicanos (PEMEX). Agora, Enrique Peña Nieto vem sendo muito criticado por ter apresentado a medida como uma forma dos preços da gasolina não aumentarem, justamente o oposto do que ocorre. Na prática, o que a reforma provocou foi a desregulamentação do preço da gasolina, aumentando impostos e tirando os subsídios que vigoravam.

Leia mais:  Sem âncora diplomática, América do Sul fica à deriva

Alguns analistas argumentam que o aumento do preço era necessário, mas criticam a falta de transparência do governo ao efetivar a medida. Por outro lado, o aumento foi um episódio intensificador das demandas sociais, que já vinham fortes devido ao aumento nos impostos e no corte de gastos nos programas sociais. No campo político, a bancada no Congresso do Partido da Ação Nacional, do ex-presidente Felipe Calderón, pediu explicações ao presidente, assim como o Partido da Revolução Democrática. A primeira medida do ano de Enrique Peña Nieto, portanto, debilitou ainda mais sua capacidade de articulação política e a sua popularidade, que já vinha em baixa. Em novembro de 2016, 69% dos mexicanos reprovavam o seu governo.

No dia 9 de janeiro, diante das inúmeras críticas e demandas sociais, Enrique Peña Nieto anunciou um Acordo para o Fortalecimento Econômico e a Proteção da Economia Familiar. Discutido por empresários, líderes sindicais, produtores e pelo governo, o acordo busca evitar aumentos “injustificáveis” nos preços dos produtos básicos. Para o presidente, foi uma medida de responsabilidade social para cuidar da economia e das famílias mexicanas menos favorecidas. O Acordo também foi apresentado como uma via para manter os investimentos neste ano e no próximo, criando empregos e gerando o crescimento econômico. Ainda assim, foi uma reação tardia da equipe governamental e que não contribuiu significativamente para melhorar sua imagem e amenizar o rechaço ao aumento do preço da gasolina.

Nota-se, portanto, que diante da magnitude da dependência mexicana em relação aos EUA, o poder simbólico e prático do discurso de Donald Trump converte-se em mais um fator de instabilidade para o México. Mesmo antes de conhecermos o que de fato será ou não implementado por Trump, as repercussões apresentadas somam-se ao cenário doméstico bastante incerto e instável para o presidente do país, que conta com escasso apoio. Assim, o México é reforçado na sua posição assimétrica frente aos Estados Unidos, apresentando baixa capacidade de reação frente ao cenário externo e interno altamente desafiador.

Também na primeira semana de janeiro, e em resposta às fracas perspectivas da relação bilateral do México com os EUA, Luis Videgaray volta ao governo como Ministro das Relações Exteriores. Então Secretário da Fazenda e do Crédito Público, Videgaray foi o principal articulador da visita de Donald Trump ao México, em agosto de 2016. Contudo, diante da reação doméstica negativa, pediu renúncia do cargo. É considerado uma figura forte do governo de Enrique Peña Nieto, justamente por ter participado da sua campanha presidencial e pela interlocução que possui com os Estados Unidos.

Mesmo assim, o peso mexicano continua a desvalorizar, o que evidencia a baixa confiança do setor empresarial no futuro econômico e político do país.